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Quando “Trickster” aparece!


As pessoas que aparecem sobre este “não-sei-o-quê”[1] demonstram ter uma autoridade diferente. Uma autoridade desautorizada, mas respeitada. Difícil será descrever este caráter indescritível aceito por Perseu em sua trajetória, verdadeiro presente de Hades! A invisibilidade que perpassa este tipo se mostra em sua evidência, sim um jogo de paradoxos que visa a com-fundir. Talvez a maior virtude arquetípica na figura do signo de gêmeos, uma dualidade permitida, não somente dual, mas ambivalente, confusão, oscilante, vibrante por assim dizer.

O mais interessante neste tipo de caráter é a “ausência de caráter”, ou melhor, a indiferença para com a moral convencional, o que não significa que não exista uma. Trickster (brincalhão) não desrespeita a lei, ele está além da mesma, a olha não com desdém, mas com certo cuidado distanciado. Ele não brinca com coisa séria, mas considera a seriedade na proporção em que esta justifica seu ser brincante.

A grande questão desta sobra ou essência que jaz no “não-sei-o-quê” se mostra em sua capacidade intrínseca, sua natureza em se ocultar mostrando no olhar uma indiferença que o distancia da moral, das leis que devem ser seguidas. Como uma serpente ele não está acima da lei, mas coexiste juntamente com esta, sem se confundir com a mesma em nenhum ponto. Como as serpentes do caduceu de Hermes, as duas serpentes são distintas, são serpentes, mas se movimentam em espiral de modo a nunca se tocarem.

O caráter mais espontâneo do Trickster revela uma autoridade acima da lei por respeitar a mesma com um cuidado para não tocá-la. Tocá-la seria se contaminar com moralina[2], principio ativo de um tipo de tóxico que corre por aí que detém a capacidade de fazer gozar o patriarcado regressivo ao mesmo tempo em que submete a pessoa a uma heteronomia da personalidade.

O truque de Trickster visa a não aparecer, não chamar a atenção para si e nisso ele não se importa. O único jeito que Perseu consegue atravessar o mundo das sombras é com a capa invisível de Hades. Este deus do submundo condena o herói a se abster de se apegar a qualquer poder instituído, visto que desta forma ele desapareceria para si em uma psicose. Capa da invisibilidade, visão que enxerga o outro lado, conhecimento analítico do próprio inconsciente. Assim como no mito de Orfeu quando este olha para traz (Eurídice voltando ao Hades) e vê-através, um espelho onde tudo ocorre ao contrário, a alma voltando para o lugar de origem, a interioridade do herói.

Trata-se de um caráter que sabe transitar no reino do limítrofe, Trickster é indiferente ao poder, pois seu poder está em sumir ou se revelar em sua imponderabilidade brincante, uma brincadeira de esconde-esconde. Assim este tipo de personalidade se mostra bem difuso como uma aparição. Está entre cá e lá, o agora e o porvir, o além e o aquém.

Ele é diferente do tipo andrógino que em sua ambivalência não possui artimanhas sendo natural e que se revela em sua pureza, ou caráter ingênuo a semelhança do romantismo de um Wherter. É muito fácil confundir os dois tipos quando não se integrou a malícia de um realismo ácido ao estilo de Nelson Rodrigues. Aqui quero me deter, pois tocamos na sombra da moral, onde ela não nos vê, no máximo pressente e foge.

O Andrógino não toca o realismo, pois o que revela o seu ser é o fantástico, o exuberante e o pomposo. O andrógino também causa mal estar a essa moral com moralina, pois ele coloca em evidência descarada a impossibilidade da média em reconhecer suas ambivalências e indiferenciações. Resumindo, suas divisões de caráter. Porém o caráter andrógino se faz na divisão unida, o que grita nele é o aparente exagero que se faz ao exteriorizar uma indiferença com o dissociado.

Deste modo, para quem consegue olhar para além das aparências, a ponto de reconhecer o essencial que se mostra na mesma, verá no andrógino o ingênuo e o puro. Aquilo que é inviolado pela cultura. Uma possível filosofia para este tipo seria algo dionisíaco para justificar ou culturalizar (antropos), jogando na esfera do auto produzido a ambivalência natural dos gêneros.

O sentimento de transgressão que o andrógino causa, é com relação a uma concepção de natureza dada e acabada. Totalmente oposta à psicologia do Hermafrodita Coroado (Figura alquímica), este tipo já integrou o realismo fazendo com que conceba a natureza como uma co-construção entre indivíduo e sociedade. Portanto a grande diferença entre o Andrógino e o Trickster são as diferentes doses de doçura e amargor.

Trickster é mais amargo, motivo pelo qual passa despercebido dos paladares mais exigentes, a média, o homem calculável (Onfray, 1995). Ao mesmo tempo não temos a coragem de arguir o homem que veste a túnica da invisibilidade, pois o julgamento para ser feito exige clareza de ideias e percepção. Deste modo Trickster é amigo da norma coletiva, serve-se desta para aparecer-sumindo. A moral que requer um Estado e uma vigilância da polícia precisa sempre reconhecer a si mesma nas transgressões da própria luminosidade (lei) e por isso não sabem o que fazer com o trans-lúcido!

A malícia deste tipo é a mais perfeita possível, pois ela demonstra a desconfiança suprema das normas, porém é aceita. A desconfiança do Trickster não é questionada e nem vista como distanciamento ou rejeição. Este tipo de caráter reflete uma indiferença até mesmo com o vil ou o imoral em si (atribuído). Simplesmente não se importa e às vezes até utiliza sua vileza para amedrontar e impor respeito através do medo. Haja vista o personagem dos contos de fada Rumpelstiltskin, o duende com a capacidade de tecer ouro a partir da palha - atribuição alquímica de extrair valor do desvalor? Malignidade ou ambivalência?

Jung (2000) irá traçar alguns paralelos acerca desta imagem ao qual se segue o mercúrio da alquimia, o bobo e todas aquelas experiências que giram em torno do carnaval, das brincadeiras que beiram a malignidade:

“Os traços tricksterianos de Mercúrio têm alguma relação com certas figuras folclóricas sobejamente conhecidas nos contos de fada: Dunga, o João Bobo e o Palhaço que são heróis negativos, conseguindo pela estupidez aquilo que outros não conseguem com a maior habilidade” (p. 251).

Descreve também que tal figura da mitologia indiana tem uma aproximação nos contos com a figura de um salvador o que revela traços tricksterianos em Javé quando testa a fé de alguns personagens bíblicos como Jó, por exemplo, destruindo também a humanidade com enchentes etc.

O Trickster como um ser originário e cósmico reflete as características divino-animal do homem, superiores, mas ao mesmo tempo inferiores a ele. “Nem está à altura do animal devido a sua notável falta de instinto e desajeitamento”(JUNG, 2000). Jung vai dizer que este arquétipo constela o reconhecimento de nossa dissociabilidade originária, aquele nosso demônio que sempre nos coloca com os pés no chão nos lembrando de um caráter primitivo que se perpetua junto com a civilização, tornando-nos mais humildes.

Desta forma ao mesmo tempo em que Trickster se mostra como uma energia potencial arquetípica de submissão à facticidade de um primitivismo que caminha junto com a civilidade, dando um colorido dissociativo, o reconhecimento de tal característica pode também ser reconhecido como um tipo de posicionamento no mundo, um posicionamento que demonstra uma inadaptação aos olhares externos, mas um temor e respeito ao mundo interno, um reconhecimento de que a natureza tem suas imprevisibilidades.

REFERÊNCIAS

JUNG, Carl Gustav. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. Petrópolis. Vozes. 2000.

ONFRAY, Michel. A Escultura de Si. Rio de Janeiro. Rocco. 1995.


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